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31 maio, 2012

De janeiro a janeiro



Era fim de fevereiro, o carnaval estava chegando e meus planos estavam á milhão, cabeças fervendo e malas prontas. Tinha mudado meus ideais, concepções e propósitos, claro que já não era mais a mesma e nem poderia ser.
Sempre gostei de janeiros, o mês que antecedia tinha vindo com boas notícias, teria finalmente a porta dos bons caminhos profissionais aberto pra mim? E veio junto com uma promoção, precisaria de alguém que fizesse uma outra parte do trabalho, da qual eu era muito capaz, mas não possuia formação para isso. Telefones tocaram e respostas vieram.  
No meio de janeiro uma nova pessoa havia entrado na minha vida, na verdade, já estava alí há um bom tempo, talvez cinco anos ou mais. Havia algo nele que o destacava por entre os outros, seu cheiro, olhar, características marcantes, ou talvez seu mau humor e sua tatuagem que teimava aparecer quando disfarçada.
Mas eu sempre continuei alí, amigável. Evitava contatos maiores por razões éticas e desculpas esfarrapadas, evitava até olhar nos olhos dele, talvez fosse medo. Estava decidida, viveria minha vida sem me deixar levar por um simples janeiro. 
Acontece que chegou fevereiro e ele foi ficando, ganhando mais espaço. Minha risada sempre alta e escandalosa fazia por várias vezes com que ele olhasse de rabo de olho. E eu nem ligava, pois o olhava de cabo a rabo.
No meio do mês não tinhamos nada um com outro, amigos, estáveis, e com pensamentos e desejos instáveis. 
Rímel preto com batom vermelho e dentes branquíssimos foi minha escolha pra noite, era algo como ir pra balada com os amigos da empresa comemorar os sucessos, encher a cara e dar vexame perdendo a compostura.
Sabe como é, né? Mais música, menos garrafa cheia, mais coragem, menos vergonha. Sempre fui livre, leve e solta, mas naquela noite eu estava muito mais e queria ir muito além. 
Quando me controlo, me amarro, mas quando me solto, não me deixo voltar. E fui. Fui para os braços fortes e tatuados, para o cheiro, mergulhei no olhar. E fui ser feliz naquela noite e disse que não voltaria, mas apenas por uma noite, quando o sol raiar nada mais vale nessa cidade.
Quando o sol raiou já era fim de fevereiro e véspera de carnaval, e lá estava eu, enrolada até o ultimo fio de cabelo naqueles lençóis lindos de tão brancos do quarto dele. Não sabia se acordava e ia embora em silêncio, se abria um sorriso e virava pro lado, se levantava rapidinho pra dar uma arrumada na cara e ele pensar que fico linda até quando acordo. Não queria abrir os olhos ainda.
Então, ele abriu primeiro e parecia ter lido meus pensamentos. Perguntou se eu era do tipo que ia embora em silêncio todas as manhãs, e eu disse que era só em casos especiais. Especialmente, o meu atraso. Tinha um almoço com as amigas pra comemorar o que viria pela frente, e não apenas pela frente.
Acho que ele sabia dos meus planos e queria me impedir, ou eu não sei porque agi assim.  
Me levantei e fui pegando minhas roupas espalhadas pelo chão, corri pro banheiro dar um jeito na cara e me vestir. Abri a gaveta e peguei uma escova de dentes nova, e todo mundo sabe o perigo disso né? Quando as escovas de dente se juntam... Ai ai ai.
Depois, voltando, o vi ainda deitado na cama, lindo. Quando me viu apenas levantou me puxando pela cintura e tascando um beijo que parecia me erguer do chão. Eu bem disse que estava atrasada. E ele sem muito mais, me convenceu a ficar. 
E lá se foi meu carnaval, minha micareta, minha Ivete Sangalo, meu trio elétrico e meu abadá. Todos dando lugar pro cara que ia ser só meu janeiro, se tornar fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto e a vida inteira. 

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